A casa-grande do Engenho Verde, em Palmares, município da Mata Sul de Pernambuco, está desaparecendo aos poucos, antes mesmo de ser inundada pela Barragem Serro Azul, obra do governo do Estado para contenção de cheias do Rio Una e abastecimento. Paredes foram derrubadas; portas, janelas, gradis, telhado e pisos sumiram; mato e árvores crescem no lugar de salas e quartos.
Em 2013, quando o Estado conduzia o processo de desapropriação do Engenho Verde, o casarão estava inteiro, mobiliado e funcionava como hotel fazenda. No ano seguinte, o governo prometeu ao Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (IAHGP) que o bangalô seria reconstituído em outra área de Palmares, com o reaproveitamento de peças do imóvel, como sugeria a secular entidade.
A ideia do IAHGP era retirar gradis, portas, janelas, escadas e outros elementos da edificação para compor o novo casarão. “Seria a primeira transferência desse tipo realizada em Pernambuco. O Itep (Instituto de Tecnologia de Pernambuco) fez o levantamento fotogramétrico preciso do imóvel e isso ajudaria no projeto. Mas sem as peças não temos como reconstituir a casa, está tudo arrebentado”, lamenta o arquiteto José Luiz Mota Menezes, do Instituto Arqueológico.
Tijolos das paredes derrubadas da casa-grande do Engenho Verde estão amontoados pelo chão. Dos cinco arcos que decoravam uma das paredes laterais do terraço, três foram demolidos. O casarão tem nove arcos na fachada principal e outros cinco na outra parede lateral. O gradil de todos desapareceu.
No desmonte do bangalô, não sobraram nem as madeiras de sustentação do telhado. Árvores de grande porte do quintal foram cortadas, ficando apenas os tocos. “E assim a história e a cultura de Pernambuco vão se acabando”, lamenta o historiador e secretário do Instituto Arqueológico, Reinaldo Carneiro Leão. De acordo com ele, a casa do Engenho Verde é uma construção da segunda metade do século 19.
O projeto da edificação é assinado pelo engenheiro militar José Tibúrcio Pereira de Magalhães (1831-1896), que desenhou o Teatro da Paz, em Belém do Pará, e restaurou o Teatro de Santa Isabel, no Centro do Recife, destruído num incêndio, informa Reinaldo Carneiro Leão. “O coronel Miguel Dias de Amorim Esteves, dono do Engenho Verde, contratou José Tibúrcio para elaborar o projeto”, afirma Reinaldo.
Segundo ele, a reconstituição da casa-grande, num terreno perto da vila da antiga Usina Serro Azul, seria uma medida compensatória pela construção do reservatório. O instituto, ao saber da barragem, solicitou o tombamento estadual do bangalô, para proteger o casarão.
“Fui consultado pela Fundarpe (Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco) sobre o tombamento e respondi que, agora, depois da destruição da casa, não havia mais nada a proteger”, declara José Luiz Menezes. Nas terras do Engenho Verde, remanescente da cultura açucareira, nasceu o dramaturgo Hermilo Borba Filho, em 1917.
Para comemorar o centenário de nascimento do romancista, a Fundação Joaquim Nabuco e o governo do Estado promovem o seminário O Invencível Hermilo, que se encerra hoje, na sala Calouste Gulbenkian da Fundaj, em Casa Forte, Zona Norte do Recife. Começa às 14h e é aberto ao público.
Sobre a destruição do bangalô do Engenho Verde, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico disse, apenas, que a edificação não será reconstituída e por estar próxima do rio não pode ser mantida. A medida compensatória do governo, para preservar a memória da casa, é o mapeamento do Itep.
A Barragem Serro Azul, iniciada em2011 e prevista para ser inaugurada em maio de 2017, é a quinta maior do Estado e tem capacidade para acumular 303 milhões de metros cúbicos de água. Cobre uma superfície de 6.295,77 quilômetros quadrados e inunda uma área de 907 hectares, beneficiando 150 mil habitantes de Palmares, Água Preta e Barreiros, detalha a Secretaria de Desenvolvimento Econômico.
“Como instituição de memória, temos de lutar para ter o melhor tratamento possível para o casarão do Engenho Verde”, afirma o historiador George Cabral, presidente do IAHGP.
Jc Online