Foto: Marlon Costa/Pernambuco Press
Desde 2014, a estudante Weidy Lemos, 21, entrou na batalha para conquistar uma vaga no curso de medicina, um dos mais concorridos entre os ‘feras’. Assim como outros concorrentes, a expectativa para obter uma boa pontuação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e ingressar em uma universidade pública aumenta ano após ano. Não é só pela alegria em ser aprovada, mas pela incompatibilidade entre a mensalidade de uma faculdade particular e o orçamento da família.
Filha de uma diarista, Weidy tem um irmão que já cursa uma graduação em uma faculdade particular no Recife, mas precisou pausar os estudos devido a uma irregularidade no Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
“Ele precisou trancar porque, com o problema que apareceu, ele teria que pagar a mensalidade integral para continuar estudando e não temos condições de fazer isso”, conta.
Com o tempo dedicado integralmente aos estudos, a estudante, que cursou o ensino médio em escola pública e atualmente tem aulas no pré-vestibular solidário da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), se sente na obrigação de passar numa instituição que não cobre mensalidades.
“Ainda vou ter os custos com livros, alimentação e transporte na faculdade. Eu não sei se consigo tentar pelo Prouni, mas pelo Fies eu sei que não dá, porque teremos custo”, afirma.
Além de enxergar uma única alternativa para realizar o sonho de ser médica, Weidy também se sente angustiada por não contribuir financeiramente com a família. “Se eu não conseguir passar este ano, vou ter que trabalhar no ano que vem. Já trabalhei antes e atualmente dou aula de reforço para alunos do 6º ano, mas a dificuldade para arrumar emprego é grande, por só ter o ensino médio”, diz, mirando as vagas temporárias normalmente abertas no fim de ano para tentar aliviar os gastos de casa.
A série de fatores que levam a estudante a se condicionar para a aprovação em uma universidade pública acaba influenciando na hora dos estudos, mas o apoio da família, dos amigos e a fé de que ela irá alcançar o que deseja ajuda a lidar. “Às vezes, fico pensando o que vou fazer da vida se eu não passar. Se eu tentar um curso mais fácil, meu sonho vai ficar para trás, mas sou insistente e não vou desistir fácil. Minha mãe me dá total apoio”, aponta a jovem.
Para o psicólogo Flávio Leão, que atua numa escola com mais de 400 alunos que já vivenciam a rotina do Enem, a pressão para obter notas suficientes para ingressar em universidades públicas é frequente entre os estudantes. Além do reconhecimento por vencer a alta concorrência, o alívio para o bolso dos pais também pesa na consciência dos alunos.
“Acredito que há um equilíbrio entre os pais que cobram os resultados dos filhos, porque querem ver que o investimento na educação deles deu certo, e os pais que incentivam e apoiam os estudos dos adolescentes. É importante que os ‘feras’ tenham um controle emocional para não deixar essas cobranças afetarem o aprendizado”, afirma.
"Se o êxito não vem de primeira, os pais e os alunos precisam entender que não é por falta de esforço, e sim por uma série de fatores que podem influenciar no resultado, como a concorrência", diz Leão
Respirar fundo, organizar uma rotina de estudos e afastar o pensamento negativo são algumas das opções para diminuir o estresse. O psicólogo orienta, ainda, a prática de esportes e de atividades lúdicas para atenuar a cobrança dos estudantes em si mesmos.
A nutricionista Sandra Xavier também auxilia a filha, Bianca Xavier, 17, a não desistir do sonho de cursar medicina. O único empecilho, no entanto, está no bolso: caso a filha seja aprovada numa universidade particular, a mãe não enxerga a possibilidade de arcar com as despesas mensais do curso, que chega a custar quase R$ 5 mil em algumas universidades pernambucanas.
Mãe de um outro adolescente de 14 anos que, assim como Bianca, é aluno de uma escola particular, Sandra é separada do pai dos filhos e, apesar da pensão, arca com as despesas de casa sozinha. “Ela [Bianca] já se sente pressionada para passar numa universidade pública. Acha que a particular é melhor, mas sabe que a gente não tem condições financeiras”, explica.
Cursando o último ano do ensino médio, Bianca tem pensamento obstinado e não desvia o olhar para as universidades particulares. Em uma prova realizada no meio do ano, a vaga em medicina ficou a oito candidatos de distância. O desempenho parece bom para uma novata, mas a jovem não se deixa levar pelo resultado. “Sei que não vou poder ficar se eu passar, então tento não me deixar abater por isso e focar nas universidades públicas”, comenta.
“Sei que não é fácil, mas já conversamos sobre isso. Tento não pressionar muito, porque ela ainda é jovem, estudiosa e vale a pena insistir no sonho”, afirma a mãe, descartando a pressa e apostando, orgulhosa, que a sobrancelha da filha será raspada mais cedo ou mais tarde para comemorar a aprovação.
G1