Publicada em 19/08/2020 às 08h05.
Projeto de lei propõe o cultivo da Cannabis medicinal no Brasil
A proposta prevê o aumento da oferta ao remédio à base da planta.


Cannabis - Foto: Iñigo Ibisate/Pixabay


O setor da Cannabis está esquentando os motores para uma grande largada no país. Nesta terça-feira (18) à noite, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) entregou ao presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (DEM-RJ) o substitutivo do Projeto de Lei 399/2015, que legaliza o cultivo da Cannabis no Brasil para uso medicinal e industrial.


A proposta prevê o aumento da oferta ao remédio à base da planta, uma vez que diminui o custo do insumo importado. Isso também significa redução de preço final nos medicamentos de Cannabis.


"Nas farmácias, há dois remédios à base de Cannabis registrados pela Anvisa [Agência de Vigilância Sanitária], o Sativex, produzido pela inglesa GW Pharma, e o Canabidiol, da brasileira Prati-Donaduzzi", diz Teixeira. Em média cada um sai por R$ 2.500. O canabidiol da Prati vem do Canadá.


Desde 2015, o Brasil permite a importação da Cannabis medicinal para o uso compassivo de pacientes refratários ao tratamento convencional. Segundo a Anvisa, 7.800 brasileiros têm autorização para importá-la.


O número de pacientes, no entanto, é bem maior. Na lista da agência estão apenas aqueles com condições econômicas de custear o tratamento em dólar. Quem não pode procura o medicamento no mercado paralelo, sem segurança de qualidade, ou nas associações de pacientes.


Em outubro, Maia determinou a formação de uma Comissão Especial para analisar a comercialização de medicamentos à base de Cannabis, prevista no Projeto de Lei nº 399 de 2015 de autoria do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE).


A comissão ainda visitou o Uruguai e a Colômbia para conversar com legisladores, empresários e representantes dos governos sobre o setor da Cannabis. No Brasil, a motivação da iniciativa é o atendimento a pacientes com doenças graves e crônicas que não respondem aos tratamentos convencionais, como a epilepsia e o câncer. Paralelamente a isso, existe a intenção de criar novos negócios e postos de trabalho para impulsionar a economia.


"Não estamos abrindo espaço para o mercado de drogas nem para o cultivo individual", diz o relator do substitutivo Luciano Ducci (PSB-PR). "Todo o processo de cultivo se submete à fiscalização para um plantio seguro, sem desvios, para termos medicamento de qualidade."


De acordo com o texto substitutivo do PL 399/2015, só empresas poderão solicitar o plantio e mediante autorização do governo e órgão competente. O projeto propõe uma lei ampla, mas simples. Não cria novos órgãos reguladores, apenas abre espaço para o cultivo, que passa a ser fiscalizado pelo Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).


À reportagem os deputados Ducci e Teixeira falaram sobre o processo e a possibilidade de aprovação do substitutivo.


Pergunta - Qual foi o grande motor para a redação deste Projeto de Lei?


Paulo Teixeira - Tudo começou com o uso medicinal e a luta dos pacientes e familiares. Por isso nossa preocupação em desenvolver um produto de qualidade. Com a inclusão da Farmácia Viva do SUS [regularizada pela portaria 826/2010, que realiza cultivo, coleta, processamento e dispensação de produtos de plantas medicinais], ele é viável. Esse tema no Brasil se deve muito às mães ao professor Elisaldo Carlini [da Unifesp].


O senhor acompanhou desde o início a luta destas mães?


PT - Em 2014, eu e o professor Carlini fomos à Anvisa pedir a liberação da importação do Sativex, remédio para epilepsia à base de Cannabis, logo depois de um congresso com as mães. Tivemos uma audiência e surgiu a RDC 017/2015, que permitia a importação do Sativex. Depois vieram os pacientes que foram à Justiça pedi e medicamento pelo SUS.


Então podemos dizer que o motor desta PL é a acessibilidade ao medicamento à base de Cannabis?


PT - O preço dos medicamentos disponíveis nas farmácias é muito elevado. Os dois medicamentos disponíveis no mercado nacional, o Mevatyl e o Canabidiol estão em torno de R$ 2.500 nas farmácias. Para aumentar a oferta, temos a necessidade do barateamento. Conversamos com as empresas e vimos que 95% dos insumos são importados.


Temos agora a chance de baratear a aquisição de insumos. Fizemos 14 audiências públicas e vimos muitos estudos que envolvem enfermidades diversas, mas principalmente a epilepsia refratária. A Cannabis medicinal tem ajudado muito a diminuir as crises em crianças. Algumas sofrem de 40 a 50 convulsões por dia. Com a medicação, elas ganham vida, passam a comer. Quem tem dores crônicas troca os opioides pela Cannabis. Os medicamentos ajudam também em doenças como fibromialgia, glaucoma, quimioterapia, entre outras. Foram essas experiências que testemunhamos durante as audiências.


Como o projeto prevê o aumento da acessibilidade?


Luciano Ducci - O medicamento será incorporado e distribuído pelo SUS por meio da Farmácia Viva. As associações de pacientes não serão prejudicadas. Elas são fundamentais no acesso democrático ao medicamento e terão de se adaptar às novas normas, mas seguindo o sistema da Farmácia Viva, que possui regras mais flexíveis que as da indústria. Além disso, os medicamentos produzidos pelas farmacêuticas nacionais devem ficar mais baratos, quando começarem a ser produzidos com insumo nacional.


O governo vai produzir o insumo para os remédios de Cannabis que distribuirá pelo SUS?


LD - É isso mesmo. O governo não terá de comprar insumos de ninguém para isso. Ele tem a Farmácia Viva, que irá cultivar a Cannabis e produzir.


Então, se aprovado o PL, a planta de Cannabis passa a ser legal?


LD - Sim, mas para o cultivo para o uso medicinal e industrial, incluindo o setor de celulose e têxtil. O PL não trata do consumo recreativo, do autocultivo e do uso religioso ou ritualístico. Este projeto de lei regula o cultivo do insumo.


Qual é a grande mudança econômica que o plantio traz ao país?


LD - O Brasil poderá desenvolver uma indústria potente e entra finalmente neste segmento. Nós já temos uma agricultura muito moderna, com tecnologia e inovação. Agora o agro ganha mais uma opção de cultivo. Este novo potencial agrícola chegará em torno de US$ 166 bilhões no mundo em cinco anos, segundo a pesquisa da consultoria Euromonitor International.


PT - Conseguiremos também desenvolver pesquisa médica nas universidades.


Ficaremos na frente de outros países?


PT - Não. Acho que nos igualaremos a outros da América Latina, como o Uruguai, no quesito medicinal. O Uruguai exporta Cannabis medicinal e industrial para a Suíça e para Israel.


Há risco de haver desvio de finalidade de cultivo?


LD - Ser um empresário da Cannabis medicinal ou industrial tem um custo e um trabalho que não compensaria esse desvio. Além disso, para ter uma licença de cultivo industrial ou medicinal, a empresa precisará ter uma demanda justificada e pré-contratada.


Como funciona a exportação?


LD - Não estamos criando novas leis de exportação, de transporte ou agrícola. O país já exporta medicamentos. A Cannabis medicinal segue as leis de exportação que já existem no setor farmacêutico.


Políticos mais conservadores dizem que o Brasil não tem estrutura para garantir a segurança do armazenamento e do transporte da Cannabis. O que o senhor diz disso?


LD - É exigida segurança no transporte e no armazenamento, mas isso fica por conta dos empresários, que não vão querer, de forma alguma, ter uma carga tão valiosa roubada.


Quais os obstáculos vocês estão encontrando?


LD - Estamos falando com várias frentes políticas para não haver dúvidas. O projeto procura atender de forma muito especial os pacientes e criar novos negócios para o Brasil. Temos um potencial de 210 milhões de consumidores. Há empresas que estão esperando a lei para entrar no Brasil, e podemos trazer renda para o Brasil no pós-pandemia. É o caso de farmacêuticas canadenses que querem produzir no nosso território. Se o país tiver coragem para aprovar a lei, logo teremos um mercado muito bom.


Já conversaram com o deputado Osmar Terra (MDB-RS), da ala mais resistente?


PT - Não, desde o início ele se mostrou sem condições de diálogo.


RAIO-X


LUCIANO DUCCI


O deputado Luciano Ducci (PSB-PR), 65, é pediatra. Foi prefeito de Curitiba de 2010 a 2012 e escolhido para ser o relator do substitutivo do Projeto de Lei 399/2015, que trata do cultivo de Cannabis, na Comissão Especial da Câmara.


PAULO TEIXEIRA


O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), 59, está no cargo desde 2007. Acompanhou a questão da Cannabis medicinal desde 2014 e foi indicado por Rodrigo Maia, presidente da Câmara, para ser o presidente da Comissão Especial da Cannabis. Formou-se em direito e é advogado


ENTENDA O PL DA CANNABIS (399/2015)


Objetivo:


- Regulamentar as atividades de cultivo, processamento, armazenagem, transporte, pesquisa, produção, industrialização, comercialização, exportação e importação de produtos à base de Cannabis para fim medicinal e industrial. O projeto não trata de autocultivo, nem do uso recreativo, religioso e ritualístico.


Quem poderá cultivar:


- Pessoa jurídica mediante a prévia autorização do poder publico. Não é possível plantar por conta própria;

- Governo através das Farmácias Vivas do SUS;

- Associações de pacientes legalmente constituídas, com adaptação às boas práticas das Farmácias Vivas do SUS, que possuem regras mais simples que a da indústria. As associações terão um ano para se adaptar.


Obrigações:


- O produtor de Cannabis medicinal é obrigado a solicitar uma cota de cultivo ao poder público que atenda demanda pré-contratada ou com finalidade pré-determinada, as quais devem constar no requerimento de autorização do cultivo. A empresa deve fornecer o número de plantas a serem cultivadas, detalhando quantas são psicoativas e quantas não são;

- O produtor de cânhamo é obrigado a fornecer a área de plantio e só pode produzir plantas não psicoativas;

- O cultivo de Cannabis deve seguir a lei brasileira de sementes nº 10.711/200;

- Rastreabilidade de toda a produção, da semente ao descarte;

- Apresentação de plano de segurança de cultivo e do local de produção;

- Ter responsável técnico legal;

- Cultivo em estufas protegido com dispositivos de segurança;

- O projeto prevê o plantio extensivo, ou seja, aberto para o cânhamo industrial.


Finalidade do cultivo de Cannabis medicinal:


- Produtos regulamentados pela RDV 327/2019 da Anvisa;

- Produtos Veterinários.


Finalidade do cultivo do cânhamo industrial:

- Industrial: têxtil, produtos de construção, cosméticos e outros.


Condições da Cannabis medicinal:


- Plantas de Cannabis com mais de 1% de THC são consideradas psicoativas;

- Plantas de Cannabis com menos de 1% de THC são consideradas não psicoativas;

- Para fins de uso veterinário só é permitido o uso da Cannabis não psicoativa;

- Os medicamentos à base de Cannabis de uso humano é considerado psicoativo se tiver mais de 0,3% de THC;

- O medicamento com teor de THC abaixo de 0,3% é não psicoativo;

- O medicamento veterinário tem de ter menos de 0,3% de THC;

- Prescritos por profissionais autorizados e receituário de acordo com a RDC 327/19 da Anvisa;

- Os medicamentos à base de Cannabis para uso humano são regulados e autorizados pela Anvisa e para uso veterinário, pelo Ministério da Agricultura;

- Os requisitos para concessão das cotas são estabelecidos pelo poder público. Os requisitos que trata esta lei não isenta o atendimento específico de regulamentação exigidas pelo poder público mediante a regulamento. Por exemplo, a Anvisa diz hoje que canabidiol (CBD) tem de ter receita azul, mas isso o governo pode mudar;

- As Farmácias Vivas do SUS devem seguir todas as obrigações deste projeto de lei;

- Farmácias magistrais podem manipular com autorização especial da Anvisa;

- As associações de pacientes ficam autorizadas a produzir produtos magistrais ou fitoterápicos, após a adequação às normas desta Lei.


Pesquisa:

- Segue a mesma lei do cultivo para Cannabis.


Exportação e importação:


- De pessoa jurídica para pessoa jurídica. A exportação será para fins medicinais e industriais. Todas as partes das plantas podem ser exportadas, inclusive as flores, como já acontece em outros países como Canadá e Uruguai;

- SUS poderá incorporar e distribuir os medicamentos de Cannabis medicinal à população.


O que muda no projeto para o Cânhamo industrial:


- A finalidade não é medicinal mas, sim, industrial;

- A lei vai autorizar a produção e a comercializações com base nas legislações infralegais correspondentes aos respectivos controles sanitários, de segurança de registro e regulatório. A produção de cosméticos, por exemplo, tem de seguir a regulação que seguem os demais produtos que não possuem cânhamo;

- Só pode ser usado pela indústria alimentícia se tiver 0% de THC;

- Para outros fins industriais, o produto deve apresentar sempre teor menor de 0,3% de THC.



FONTE: FOLHAPE.COM.BR

Os comentários abaixo não representam a opinião do Portal Nova Mais. A responsabilidade é do autor da mensagem.
TODOS OS COMENTÁRIOS (0)



Login pelo facebook
Postar
 
Curiosidades
Policia
Pernambuco
Fofoca
Política
Esportes
Brasil e Mundo
Tecnologia
 
Nova + © 2024
Desenvolvido por RODRIGOTI