O esquema criminoso investigado pela Polícia Federal na Operação Turbulência, deflagrada nesta terça-feira (21) em Pernambuco e em Goiás, tem envolvimento no financiamento da campanha de reeleição do então governador de Pernambuco, Eduardo Campos, em 2010. "O esquema foi utilizado para pagar propina na campanha do governador”, afirmou a delegada federal Andrea Pinho, durante entrevista coletiva.
Quatro pessoas foram presas nesta terça - João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho, Eduardo Freire Bezerra Leite, Arthur Roberto Lapa Rosal e Apolo Santana Vieira. Todos foram encaminhados para a sede da PF, no Recife.
A polícia apontou que havia ainda relação direta da organização com a compra do avião que caiu e provocou a morte do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB), durante a campanha presidencial de 2014. “Essas empresas transitavam entre si e realizavam movimentações milionários, na conta de outras empresas igualmente de fachada e na conta de outros laranjas. Elas integravam uma organização criminosa especializada em lavagem de dinheiro, que vem desde 2010 e que decaiu após a queda do avião", explicou a delegada.
A OAS repassou R$ 18,8 milhões em serviços de terraplanagem nas obras de construção do Rio São Francisco. A polícia federal investiga se essa transação paga pela OAS foi destinada a compra do avião usado por Eduardo Campos. "Tudo começou com a história do avião, mas agora queremos desarticular toda essa organização. Quem são os envolvidos, o que fizeram e quem foram os beneficiados", completou o delegado Daniel Silvestre.
O senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), ex-ministro da Integração Regional do governo Dilma Rousseff (PT), responsável pela obra no sertão nordestino, teria atuado, segundo a PF, na coleta de fundos para os gastos na campanha eleitoral. "O indicativo que a gente tem é que Fernando Bezerra Coelho teria sido a pessoa encarregada de colher, digamos assim, os valores do percentual devido para a campanha do ex-governador. Teria-se feito um esquema criminoso, se era ele de fato ou não, isso não tenho como afirmar", apontou a delegada.
O site entrou em contato com o Partido Socialista Brasileiro em Pernambuco (PSB-PE), com o senador Fernando Bezerra Coelho e com a OAS, mas ainda não obteve resposta, e segue tentando contato com os advogados dos presos na operação. A família do ex-governadorEduardo Campos informou que não iria se pronunciar por enquanto.
Até o fim da manhã, operação cumpriu 35 mandados de busca e apreensão, 16 conduções coercitivas, quatro prisões preventivas, além da apreensão de dois helicópteros e um avião avaliados em R$ 9 milhões. A polícia ainda apreendeu U$ 10 mil com Eduardo Freire.
"Para não chamar a atenção e não alertar os outros investigados, uma equipe da polícia federal à paisana embarcou com os dois no avião que seguiu para São Paulo. Eles só foram presos quando pausaram em Guarulhos", detalhou Andrea. Ainda de acordo com a delegada, João Carlos se diz o dono do avião.
O próximo passo da operação é descobrir quem eram os clientes da organizado criminosa. "Estamos com a esperança de que essas ouvidas de hoje nos levem a nomes. Não descartamos o envolvimento de outros políticos ou empresários", pontuou o delegado Daniel Silvestre.
A Operação Turbulência, desencadeada nesta terça-feira (21), teve como alvo empresas envolvidas na compra do avião, que teriam ligação até com o esquema investigado pela Operação Lava Jato. Algumas delas seriam de fachada, segundo a PF. Há a suspeita de que parte do dinheiro movimentado serviu para pagar propina e formar "caixa dois" de empreiteiras.
Presos
Os empresários João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho e Eduardo Freire Bezerra Leite foram presos quando desembarcavam em São Paulo, mas foram levados para o Recife e chegaram ao Aeroporto dos Guararapes às 9h50. João Carlos afirmou à PF ser o dono do jato em que Campos estava, segundo os investigadores.
Mello Filho seria um dos donos do jato que levou Eduardo Campos, segundo a empresa AF Andrade, que tem o registro da aeronave na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Em 2014, o PSB afirmou que o uso do jato na campanha eleitoral havia sido autorizado por Mello Filho e Apolo Santana Vieira.
Vieira, que também empresário, foi preso em uma academia, no bairro de Boa Viagem, Zona Sul da capital pernambucana. Arthur Roberto Lapa Rosal foi preso em casa, em Vitória de Santo Antão, na Mata Norte de Pernambuco. O quinto mandado, ainda em aberto, é para Paulo César de Barros Morato.
A previsão é que os presos prestem depoimento na sede da PF, no Cais do Apolo, região central do Recife, e depois sejam encaminhados para o Centro de Triagem (Cotel), em Abreu e Lima. Os envolvidos responderão pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.
O site entrou em contato com o PSB nacional informou que está em reunião e, somente após o encontro, vai se manifestar. O Governo de Pernambuco também informou que deve se manifestar ainda nesta terça.
Operação Turbulência
Duzentos policiais federais cumprem 60 mandados judiciais, sendo 33 de busca e apreensão, 24 de condução coercitiva e cinco de prisão preventiva.
Também estão sendo cumpridos mandados de indisponibilidade de contas e sequestro de embarcações, aeronaves e helicópteros dos principais membros da organização criminosa.
Os mandados judiciais são cumpridos em 18 locais de Pernambuco, além do Aeroporto Internacional dos Guararapes Gilberto Freyre, na Zona Sul da capital.
Os agentes estiveram nos seguintes bairros do Recife: Boa Viagem, Pina, Ibura e Imbiribeira (Zona Sul), Espinheiro, Alto Santa Terezinha (Zona Norte), além de Cordeiro e Várzea (Zona Oeste). Também houve ação nas cidades de Paulista, Jaboatão dos Guararapes, Vitória de Santo Antão, Moreno e Lagoa de Itaenga, além de Goiânia e Aparecida de Goiânia (GO).
Suspeitas da PF
A investigação começou a partir da análise de movimentações financeiras suspeitas detectadas nas contas de algumas empresas envolvidas na aquisição da aeronave Cessna Citattion prefixo PR-AFA.
A Polícia Federal constatou que essas empresas eram de fachada. Elas foram constituídas, de acordo com a PF, em nome de laranjas. Os sócios investigados são apontados como responsáveis por diversas transações entre si e com outras empresas fantasmas. Durante as apurações, os agentes chegaram até nomes conhecidos de grupos citados na Operação Lava Jato. Há suspeita de que parte dos recursos que transitaram nas contas examinadas servia para pagamento de propina a políticos e formação de “caixa dois” de empreiteiras.
Investigados
Eduardo Ferreira Bezerra Leite, João Carlos Lyra Pessoa de Melo Filho e Apolo Santana Vieira foram citados em documentos da operação de compra e venda do jato Cessna, utilizado pela comitiva. O dinheiro usado para pagar o avião teria passado por escritórios em Brasília e São Paulo, além de uma peixaria fantasma em uma favela do Recife.
Os extratos entregues à Polícia Federal mostram o recebimento de 16 transferências, de seis empresas ou pessoas diferentes, num total de R$ 1.710.297,03. Nesses documentos, aparecem os números do CPF das pessoas físicas ou do CNPJ das empresas que transferiram dinheiro para a AF Andrade, então dona da aeronave, segundo a Anac. Com esses números foi possível chegar aos donos das contas.
Uma das empresas citadas, a Leite Imobiliária, pertence a Eduardo Bezerra Leite e recebeu R$ 727 mil, em 15 de maio, segundo os extratos – essa transação seria apenas um dos negócios envolvendo o jato. João Carlos Pessoa de Mello Filho teria recebido repasses de R$ 195 mil, da AF Andrade, mas a empresa afirmou que já tinha repassado a aeronave para outro empresário, que emprestou para a campanha de Campos.
À época, o empresário João Carlos Lyra declarou que, para honrar compromissos com a empresa AF Andrade, fez vários empréstimos com o objetivo de pagar parcelas atrasadas do financiamento do Cessna. A Leite Imobiliária confirmou que transferiu quase R$ 730 mil para a AF Andrade, como um empréstimo a João Carlos Lyra. O PSB declarou, na época, que o uso do avião foi autorizado pelos empresários João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho e Apolo Santana Vieira.
Operação Turbulência da PF mobilizou 200 agentes da PF (Foto: Divulgação)
O acidente
A queda da aeronave ocorreu por volta das 10h do dia 13 de agosto de 2014, em um bairro residencial de Santos. O então candidato tinha uma agenda de campanha na cidade. O avião decolou do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, com destino ao aeroporto de Guarujá.
Além de Campos, outras seis pessoas estavam na aeronave: Alexandre Severo Silva, fotógrafo; Carlos Augusto Leal Filho (Percol), assessor; Geraldo Magela Barbosa da Cunha, piloto; Marcos Martins, piloto; Pedro Valadares Neto e Marcelo de Oliveira Lyra.
O relatório final do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos(Cenipa) da Força Aérea Brasileira (FAB) sobre o acidente aéreo, que foi divulgado em janeiro, apontou quatro fatores que contribuíram para a queda do avião. São eles: a atitude dos pilotos, as condições meteorológicas adversas, a desorientação espacial e a indisciplina de voo. Também há fatores que podem ter contribuído, mas que não ficaram comprovados, como uma eventual fadiga da tripulação.
A defesa dos familiares do piloto e do copiloto do avião que caiu afirmou ao site, na época, que seus clientes ficaram "inconformados". O advogado Josmeyr Oliveira, responsável pela defesa dos familiares dos pilotos, reclamou na ocasião que, na opinião dele, o documento "deposita toda a culpa pela tragédia" sobre a tripulação e não avança sobre possíveis falhas da própria aeronave.
G1